Entidades sindicais se mobilizam contra nova Reforma Administrativa

Uma nova Reforma Administrativa se torna pauta de discussão no Congresso Nacional repercutindo como um novo ataque ao serviço público, segundo entendimento das entidades sindicais. Ameaças às carreiras, contratações temporárias e perda de estabilidade são alguns dos principais riscos apresentados. Nesta semana ocorreu mais uma audiência pública com entidades da sociedade civil e o Grupo de Trabalho responsável, que deverá apresentar na próxima semana o relatório da proposta do projeto à Câmara Federal.

A avaliação de alguns sindicatos é que a proposta revela uma aliança político-empresarial visando subverter o papel do Estado de garantidor universal de direitos em negócios para o capital privado. Os deputados estariam apresentando, na prática, um desmonte do serviço público sob o pretexto de “modernização” e “eficiência”, e ainda culpabilizando o funcionalismo pela crise fiscal. Terceirização, precarização dos vínculos, privatizações, metas e produtividade ligadas à lógica do mercado, são alguns dos pontos criticados.  

O representante da Fenamp, Alberto Ledur, defendeu na audiência a estabilidade dos servidores como fundamental à autonomia e continuidade de serviços de qualidade à sociedade. Ele também destacou o adoecimento mental dos colegas com base na pesquisa realizada pelo CNMP, que revela altos índices de sofrimento psíquico e doenças ocupacionais no âmbito do Ministério Público. A sobrecarga de trabalho e a precarização das condições laborais são determinantes neste contexto, acrescentou Ledur, que também denunciou o aumento de cargos comissionados chegando a superar os efetivos em oito estados. 

No dia 28 de maio foi criado um Grupo de Trabalho pelo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (REP-PB) e o texto base para as discussões foi apresentado pelo deputado Zé Trovão (PL-SC), ambos de oposição ao governo. O relatório do projeto será apresentado na próxima semana e avaliado pelo presidente da Câmara para verificar a viabilidade de pautá-lo no Plenário, após o cumprimento de todos os ritos administrativos. Após a audiência da última terça-feira (08/07), que contou com a participação de gestores da União, estados, municípios e parlamentares, o relator do grupo de trabalho, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), não descartou a possibilidade de criação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC).

O Grupo de Trabalho responsável tem um tempo menor para entregar seu relatório em comparação ao da PEC 32, reforma proposta no governo Bolsonaro não totalmente derrubada  e atualmente parada na Câmara, e é composto majoritariamente por grupos próximos ao setor privado. Os parlamentares que se mobilizaram pela criação do GT não têm histórico de defesa do serviço público e deram voz prioritária às entidades vinculadas ao setor privado, que visam a flexibilização da estabilidade dos servidores, pilar fundamental na entrega de serviços públicos de qualidade à população, segundo Mariel Angeli Lopes, supervisora técnica da regional do Dieese em Brasília (DF). Enquanto a sociedade tem discutido a melhor aplicação e eficiência nos impostos com a necessidade de o Estado taxar os mais ricos, disse a pesquisadora, a reforma administrativa foi pautada na contramão sem reivindicar nenhuma questão social a partir dos serviços ofertados.

“Nos últimos anos tivemos um desmonte do estado brasileiro, que vem se recompondo desde 2023. Existem várias iniciativas em todas as esferas para dar mais eficiência na oferta dos serviços públicos. Precisamos aumentar a presença dos servidores nas áreas mais importantes, como educação, segurança e saúde. Essa proposta vem no sentido contrário, com uma ótica muito mais privada com propostas de muitas entidades do terceiro setor pedindo a desregulamentação do serviço público com mais flexibilidade de contratação facilitando o ingresso temporário e sem concurso público”, afirmou Lopes.

Uma das maneiras de convencer a opinião pública sobre a reforma administrativa tem sido falar sobre salários elevados dos servidores, alerta a supervisora do Dieese, embora o Atlas do Estado Brasileiro do IPEA aponte justamente o contrário: por volta de sete dos doze milhões de servidores estão no executivo estaduais e municipais e não têm esses supersalários. Ela explica ainda que mesmo no âmbito federal existem muitos professores e trabalhadores do INSS, com salários baixos que prestam benefícios essenciais à população, e que a proposta de reforma administrativa atual não atinge esse setor tão criticado.  

“Os supersalários estão concentrados em setores que não são discutidos nessa reforma administrativa e na proposta da PEC 32 em 2020: eles estão principalmente no magistrado, juízes e desembargadores, e promotores do Ministério Público, que são grupos com regras próprias, orçamentos e controles separados, e não estão nesta discussão. Não tem como discutir supersalários, porque é um grupo muito pequeno que não estará sujeito à reforma administrativa nos moldes atuais”, concluiu.

De acordo com Vânia Márcia de Sousa Leal Nunes, presidente da Ansemp, é extremamente importante que todos acompanhem as novas discussões e participem das mobilizações. “Vários temas são prejudiciais aos servidores, como mudanças nas regras de concursos, a criação de novos vínculos para futuros servidores e a revisão de carreiras, que já foram discutidos na PEC32/2020 e podem voltar, além do fato de que a própria proposta não foi rejeitada e pode ser ressuscitada”, afirmou.

O deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), relator do grupo de trabalho, também afirmou em entrevista recente à CNN que há janela para aprovação das medidas antes das eleições de 2026. Segundo ele, o foco das discussões está em torno da eficiência e da modernização do Estado. O deputado defende que as carreiras de Estado podem ser reduzidas e menos engessadas, com concursos menos segregados, e tempos mais dilatados de progressão. 

A expectativa das entidades de classe é que as propostas apresentadas nas audiências públicas pela sociedade civil sejam contempladas no anteprojeto, de modo a garantir os direitos dos servidores e um serviço público de qualidade, e não prevaleçam as mudanças apresentadas pelos setores privados e parlamentares que defendem o estado mínimo. As organizações sindicais seguem atentas e acompanhando as discussões em Brasília para  pressionar os deputados.