Entre afetos e lembranças, servidora do MPRJ aborda a complexa relação entre mãe e filha em livro.
A coluna Servidor em Foco deste mês traz a divulgação do livro De Amor e outros Ódios, da associada Camila Parobé Anllelini, que foi semifinalista do Prêmio Jabuti 2024 e finalista do Prêmio Minuano de Literatura 2024. Sua obra já vendeu mais de 500 exemplares e lhe rendeu a participação em diversos debates, como na Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP) e Bienal do Livro, além de entrevistas para O Globo, Le Monde Brasil, Metrópole, dentre outros veículos de comunicação.
Camila é servidora do MPRJ desde 2013 e, atualmente, está lotada na Secretaria das Procuradorias da Infância e da Juventude. Mestre em Resolução de Conflitos e Mediação e pós-graduada em Psicanálise, Arte e Literatura, ela também é associada ao Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro. Seu livro foi publicado em setembro de 2023 pela Editora Patuá e fala sobre a relação de uma filha com a mãe.
Segundo a autora, remete às suas memórias, mas de modo a trazer elementos atemporais e universais, já que todos somos marcados pela presença ou ausência da mãe. Na entrevista à Assemperj, ela fala sobre literatura, suas inspirações e referências, as expectativas sobre seu futuro no meio e os próximos livros que estão sendo pensados.
Como a literatura entrou na sua vida?
A literatura está presente na minha vida desde que fui alfabetizada e encontrei nos livros o caminho para ampliar o mundo. Muito cedo me tornei uma leitora contumaz e, pela via da educação, por meio de uma professora de português, descobri que eu tinha algo a fazer com a curiosidade que andava comigo. Passei a escrever, porém, somente em 2018 a escrita se tornou parte do meu ofício — a partir de publicações digitais, em coletivos de escritoras e, posteriormente, com a publicação do meu primeiro livro.
Fale sobre o seu livro ter concorrido a grandes premiações no universo da literatura.
Essa é uma das maiores realizações de quem trabalha: ter seu trabalho reconhecido. No entanto, não é com esse fim que escrevo. As indicações aos maiores prêmios literários do país foram uma consequência feliz e surpreendente, dado o grande número de escritores e escritoras excelentes em todo o Brasil. Eu acredito no trabalho, na insistência e na constância. Escrever é um trabalho de insistência — de dizer de forma diferente aquilo que já está no mundo, é olhar pelos detalhes e dar contorno ao que até então passava despercebido.
Quais são as suas referências literárias e inspirações para escrever?
Tudo me inspira a escrever, não só a literatura. Uma cena cotidiana, uma conversa fragmentada de duas pessoas em local público, um ângulo novo nos percursos de sempre; qualquer recorte da vida pode se transformar em material literário. Considero sempre injusto pinçar nomes como referência, porque sei que deixo outros tantos à margem sem que mereçam. Mas Clarice Lispector, com seu estilo de fluxo de consciência, é uma grande inspiração; Lygia Fagundes Telles, Hilda Hilst, Socorro Acioli, Mariana Salomão Carrara e, atualmente, Cristina Peri Rossi; quem eu deveria ter conhecido há muito tempo. São muitas as mulheres que me inspiram, não necessariamente em estilo narrativo, mas pela coragem de fazer o que fazem.
Como é trabalhar no MPRJ em paralelo com o fazer literário? Pensa em largar o serviço público um dia para viver de livros?
Pretender viver de livros no Brasil é como dizer que há vida em Marte, há uma pequena chance, mas ninguém nunca consegue atestar (risos). Brincadeiras à parte, é realmente muito difícil um escritor brasileiro encontrar sustento exclusivamente pela venda de seus livros, mesmo os mais conhecidos, exceto quando se torna um best seller, são casos raros. O fazer literário complementa minha atuação profissional, anda junto e seguirá. Até o momento, não há qualquer pretensão de largar o serviço público.
Conte um pouco sobre como se deu a criação e preferência temática do seu livro.
Esse livro surgiu pelo título, que por fim não foi o escolhido, mas deu norte ao que seriam os textos que compuseram o projeto. A relação com a mãe me interessa, especialmente como psicanalista, com toda sua complexidade e idiossincrasias. De Amor e outros Ódios é um livro escrito a partir de memórias, embora eu faça questão de salientar que a memória é em si uma ficção. Portanto, aquilo que podemos fazer do que nos acontece já não é mais o fato acontecido. Ter escrito essa história me possibilita descobrir aquilo que de universal nessa relação de todos nós, marcados pela presença ou pela ausência, ninguém sai ileso de uma mãe.
Você tem projetos para próximos livros?
Sim, tenho um livro em andamento, um romance ainda em fase de produção. Além desse, há mais dois ou três projetos me rondando, ainda a serem trabalhados.
Foto: Bruno Bou Haya.